terça-feira, 7 de abril de 2015

Deus existe?

Deus deve existir

A tentativa de mostrar que é racional crer em Deus tem uma longa história. Os quatro argumentos discutidos aqui tentam inferir a existência de Deus da ideia de Deus, da existência do Universo, da evidência de que o Universo foi planejado e da experiência religiosa.
  Santo Anselmo afirmou que podemos deduzir a existência de Deus. Apenas pensando sobre o que Deus é, podemos concluir que ele deve existir. Assim:

-Por definição, Deus é um ser tão grande que maior não pode ser concebido.
-Deus pode ser concebido como mera ideia ou como realmente existindo.
-Existir é maior que não existir. Portanto Deus deve existir.

Isso é conhecido como argumento ontológico. 
  Gaulino, um monge do século XI, replicou que esse argumento permite provar que qualquer coisa perfeita deve existir. Por exemplo, posso pensar na ilha perfeita,"tão excelente que melhor não possa existir"; portanto, essa ilha deve existir, porque seria  menos excelente se não existisse. Mas isto é absurdo. É claro que tal ilha não existe. Não se pode inferir a existência de algo da ideia de que esse algo é perfeito. Anselmo estava ciente do problema e respondeu que o argumento ontológico funciona apenas para Deus, porque a relação entre Deus e grandeza ou perfeição é única. 

Deus, o maior

Ilhas não são perfeitas por definição. A perfeição é algo que uma ilha pode ter ou não. Uma ilha imperfeita ainda é uma ilha, porque a perfeição é uma propriedade "acidental", não "essencial" de uma ilha.
Uma propriedade essencial é aquela que algo deve possuir para ser o que é. Em contraposição, Deus tem de ser o maior ser concebível. Por definição, Deus não seria Deus se houvesse algum ser superior a Ele.
Ser maior ser concebível é uma propriedade essencial de Deus. Mas para se qualificar como o maior ser concebível, Deus deve existir.

Existência e perfeição

A resposta de Santo Anselmo não convenceu Tomás de Aquino, para quem a existência não é uma perfeição, algo que se torne um ser maior. Assim, o argumento não mostra que Deus existe. Segundo ele, pode mostrar no máximo que há algum vínculo entre o conceito de Deus e o conceito de existência, porquanto um requer  existência e o outro não. 
  O argumento ontológico apresenta outro problema. Suponha que defino o objeto 1 como algo que é redondo, vermelho e pesa cinco toneladas. Depois, defino o objeto 2 como algo que é redondo, vermelho, pesa cinco toneladas e existe. A única diferença entre os dois é que um existe e o outro não. Posso facilmente imaginar o objeto 1, mas posso imaginar o objeto 2? Obviamente, se não houver o objeto 1, quando tento imaginar o objeto 2 só consigo imaginar o objeto 1. Como a coisa que imagino não existe realmente, ela não pode ser objeto 2. Uma restrição similar aplica-se ao argumento de Anselmo. A primeira premissa afirma que posso conceber "um ser tão grande que maior não pode existir", a saber, Deus. Mas o ser que concebo será  Deus? Não se Deus não existir! Portanto o argumento parece ser uma petição de princípio: pressupõe que Deus existe.

O deus nórdico Thor era conhecido por seu gênio terrível. Mas Deus não é Deus ao menos que seja perfeito - o que desclassifica Thor.

Objeção de Kant

Considera-se que Kant derrotou o argumento ontológico, pelo menos nessa forma, de uma vez por todas. Segundo ele, o argumento supõe erroneamente que a existência é uma propriedade. Mas as coisas não "têm" existência do mesmo modo que "têm" outras propriedades. Considere se a afirmação "Deus existe" é analítica ou sintética*. Segundo Anselmo, deve ser analítica - o conceito de "Deus" contém a ideia de existência, assim "Deus não existe" é uma contradição em termos. Mas, afirma Kant, existência nada acrescenta a um conceito, nem o define. Dizer que algo existe significa apenas que algum objeto corresponde ao conceito.
 Existência, conclui Kant, não é parte de nenhum conceito, nem do de Deus. Portanto, não é verdade que "Deus não existe" tem de ser verdadeiro.

*Uma proposição  é analítica se for verdadeira ou falsa apenas em virtude do significado das palavras. Como "nenhum solteiro é casado" é analitico  , é também a priori. Uma proposição é sintética se não for analítica: é verdadeira ou falsa em virtude não do significado das palavras, mas dos fatos. Assim, por exemplo,"não há avestruzes na Islândia" é sintético.

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